Urbanização com participação popular

publicado em 24 de janeiro de 2014

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A decisão da Justiça que anulou todos os projetos aprovados pelo Conselho de Planejamento Urbano do DF (Conplan) em 2013 fará com que os processos relativos a vários empreendimentos importantes voltem à estaca zero. Entre as propostas que passaram pelo colegiado e que terão que ser revistas, estão a criação do novo aterro sanitário, em Samambaia, a liberação de lotes para o governo federal na Esplanada dos Ministérios, o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico do DF (PPCub) e até a ampliação do Estádio Nacional. A regularização de 11 condomínios, como Vicente Pires, também tinha recebido o aval dos conselheiros, mas ficará suspensa.

Na última terça-feira, a 3ª Vara de Fazenda Pública do Distrito Federal declarou a nulidade de todos os atos que passaram pelo Conplan no ano passado. A Justiça atendeu um pedido do Ministério Público do DF, que questiona a participação da sociedade no Conselho de Planejamento. O GDF vai recorrer da decisão e espera reverter a decisão em segunda instância.

Em outubro de 2009, o Ministério Público abriu processo para acompanhar a atuação do Conplan e identificou supostas irregularidades na indicação de integrantes do colegiado. O MP questionou que, dos 10 representantes da sociedade civil no colegiado, todos teriam sido indicados diretamente pelo governador e não pertenceriam a nenhuma associação ou entidade representativa. Com isso, o Ministério Público recomendou alterações na lei que regulamentava o conselho e mudanças no sistema de indicação dos conselheiros. “A situação transformou o Conplan em um órgão exclusivamente governamental, alijando a sociedade dos debates cruciais para o planejamento do futuro do uso e ocupação do solo da capital”, alegou, à época, o MP, que determinou ao governo a realização de eleições para a escolha dos integrantes.

O GDF alega que não existe legislação que estabeleça a necessidade de eleição para o Conselho de Planejamento e afirma que os indicados pelo Palácio do Buriti representam importantes entidades do setor produtivo e dos movimentos sociais. Mas o juiz Jansen Fialho de Almeida acatou os argumentos do MP e suspendeu as decisões do Conplan.

Em sua decisão, o magistrado alegou que a sociedade civil precisa ser consultada. “Por ser da competência do Conplan auxiliar o governo nas atualizações de diretrizes da política territorial e urbana do DF, a consequência das decisões ali assentadas repercutirão no futuro da capital de forma permanente”, alegou o magistrado. “O objetivo da participação popular no processo deliberativo das políticas urbanas é, por óbvio, mitigar o poder conferido aos gestores públicos de sorte que os habitantes legitimamente interessados tenham voz ativa no processo”, acrescentou Fialho.

O chefe da Assessoria Jurídica da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Ebllas Ávila, afirma que o governo vai recorrer. “A gente respeita a decisão, mas o fato é que ela vem com enorme insegurança jurídica porque suspende importantes projetos na área de habitação e desenvolvimento urbano”, acrescenta.

A titular da 3ª Promotoria de Justiça da Ordem Urbanística do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), promotora Maria Elda Fernandes, reconhece que a decisão traz consequências. “Mas esse foi o risco assumido pelo governo, que insistiu em realizar as reuniões do Conplan, apesar da ação e da decisão liminar que suspendeu suas atividades”, pondera. Com a decisão, caberá ao GDF definir a composição do conselho de uma forma que garanta a participação da população nas discussões. Para a promotora, a decisão é de vanguarda. “A sentença, que foi muito bem fundamentada, coloca o DF sob um novo paradigma com relação à gestão democrática e participativa”, afirma.

Futuro

O urbanista Aldo Paviani, professor da Universidade de Brasília, defende a participação popular efetiva na formação do Conplan. “A decisão da Justiça foi boa. Nosso território não é infinito e, por isso, todas as decisões relativas à urbanização têm que ser bastante democráticas. Cabe a nós definir qual espaço vamos deixar para os futuros brasilienses”, explica o especialista. “Se tivesse havido uma participação maior da sociedade, não teria ocorrido essa polêmica toda com o PPCub”, acrescenta Paviani.

Entre os condomínios aprovados pelo Conplan, em 2013, estão o Vivendas Bela Vista, em Sobradinho, o Ouro Vermelho II, no Jardim Botânico, e toda a região de Vicente Pires. Dois parcelamentos na antiga Fazenda Paranoazinho, o Jardim América e o Vivendas Friburgo, também estão na lista. O diretor da empresa Urbanizadora Paranoazinho, Ricardo Birmann, diz que a decisão traz insegurança jurídica. “O Conplan é a instância que regula o planejamento da cidade. Isso vai incentivar o uso ilegal do solo, que é um problema sério no DF”, explica.

(Correio Braziliense)