Biodiversidade brasileira só ganha com unidades de conservação
publicado em 20 de julho de 2015
Lei que regulamentou o Sistema de UCs no Brasil celebra 15 anos
Em seu poema de 1959, Receita de Mulher, Vinícius de Moraes faz uma provocação “As muito feias que me perdoem; Mas beleza é fundamental”. Ele segue sua narrativa sobre a beleza e a não beleza mesmo sabendo que o conceito, para cada um de nós, é particular. O belo para um pode não ser para outro. E só há um consenso no mundo da beleza. A da natureza, em todas as suas manifestações. E o poeta prossegue: “É preciso que haja qualquer coisa de flor em tudo isso…”
Sejam experiências de mergulho em Noronha, de caminhadas na Tijuca, de passeios nas dunas de Lençóis Maranhenses, de trilhas intensas em Veadeiros ou na Diamantina, ou mesmo a vivência do modo de vida rico dentro de uma reserva extrativista. Tudo isso é extremamente intenso. Conecta cada pessoa que experimenta algum parque ou reserva desse Brasil.
E basta pensar em uma beleza cênica brasileira para constatar: ela é uma beleza cênica protegida por lei. Está materializada em um parque, reserva ou floresta. E se a beleza que vem à mente não é protegida por lei federal, certamente é uma unidade de conservação estadual ou municipal. Ou seja, as 12 categorias de Unidades de Conservação federais elencadas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação – conhecido popularmente como SNUC (Lei 9.985/2000) se materializaram no Brasil. Para nosso bem e de todo o planeta.
Do primeiro parque brasileiro – Itatiaia (RJ), em 1937 – até a última unidade de conservação criada em 2014 – Estação Ecológica Alto Maués (AM) –, o Brasil chegou ao patamar de 320 Unidades de Conservação (UCs) federais e mais de 76 milhões de hectares de rica biodiversidade protegida. Os desafios para implementá-las continuam, mas há que se fazer o reconhecimento dos avanços que aconteceram de quando Itatiaia foi criado até hoje.
Celebrar os 15 anos da Lei 9.985/2000 significa celebrar a vitória da natureza e sua opulência. Mais do que rememorar os embates e lutas travadas para que o Brasil possuísse um Sistema de Unidades de Conservação próprio, é preciso constatar que ganhamos todos nós, cada ser humano ganhou a natureza e toda a biodiversidade. E que venham mais 15, mais 15, mais 15 e muitos outros 15 anos desta Lei. E que essas 320 Unidades se multipliquem ainda mais ao longo da história da conservação da biodiversidade brasileira.
Veja o Mapa Temático das Unidades de Conservação Federais.
Cronologia da aprovação da Lei que criou o SNUC:
1989 – O anteprojeto foi entregue ao Ibama e encaminhado à Casa Civil da Presidência da República. A Casa Civil introduziu a primeira grande modificação na proposta original: suprimiu os dispositivos que criminalizavam as agressões às Unidades de Conservação, substituindo-os por sanções administrativas, sob protestos da comunidade ambientalista.
1992 – O anteprojeto chegou à Câmara dos Deputados, recebeu o nº 2.892 e foi encaminhado à Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias – CDCMAM, única Comissão designada para se pronunciar sobre o mérito do projeto, com poderes conclusivos.
Relator: Deputado Fábio Feldmann
Assessor: Maurício Mercadante
1994 – Ministério do Meio Ambiente organizou um importante workshop sobre Unidades de Conservação, onde um primeiro substitutivo ao projeto de lei foi amplamente debatido.
Final de 1994 – O deputado Feldmann entregou à CDCMAM, um substitutivo preliminar.
1995 – Novo relator: o deputado Fernando Gabeira.
CDCMAM, sob a presidência do deputado Sarney Filho: seis audiências públicas fora do Congresso, para promover um amplo debate sobre o projeto de lei do SNUC.
Cidades: Cuiabá, Macapá, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador.
1996 – Foram realizados três eventos: um workshop organizado pelo Instituto Sócio-Ambiental – ISA para analisar experiências concretas de conservação envolvendo populações tradicionais ou rurais, e dois seminários na Câmara dos Deputados, o primeiro, bastante polêmico, sobre a presença humana em Unidades de Conservação e o segundo dedicado às Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPNs.
Final de 1996 – O relator ofereceu o seu substitutivo para ser votado pela Comissão. Votação do projeto não ocorreu.
Começo de 1998 – O relator deputado Gabeira solicitou e foi aprovado o regime de urgência para o projeto, mas a falta de uma decisão política impediu que ele entrasse na ordem do dia do Plenário.
Primeiro semestre 1998 – Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável, entidades ambientalistas “conservacionistas” e “sócio-ambientalistas” se reuniram para tentar encontrar uma proposta de consenso para o SNUC.
Início de 1999 – O Fundo Mundial para a Natureza – WWF, o ISA e o Instituto de Estudos Sócio Econômicos – INESC, deram início a uma campanha e mobilização em favor da aprovação do projeto.
Junho de 1999 – O governo apresentou sua proposta, com o apoio da Casa Civil. As modificações sugeridas foram, no essencial, aceitas pelo relator.
9 de junho de 1999 – O projeto foi finalmente a votação e aprovado na CDCMAM no dia 9 de junho, com algumas modificações pouco importantes em função de emendas apresentadas por deputados da Comissão.
10 de junho – Votado e aprovado no plenário da Câmara dos Deputados, com uma modificação importante: uma área protegida agora só pode ser criada mediante lei.
18 de julho de 2000 – Votado e aprovado no plenário do Senado Federal.
Fases do projeto
O primeiro texto é o projeto original do Poder Executivo.
O segundo é o substitutivo do deputado Fernando Gabeira antes das modificações propostas pelas entidades ambientalistas em 1998.
E o terceiro é o texto aprovado no Plenário da Câmara dos Deputados.
Mudanças no texto
art. 2º, inciso XV (população tradicional foi definida de forma mais rigorosa do que no texto final);
art 5º (introduziu princípios ausentes no projeto original);
art. 9º (a categoria Reserva Biológica, conceitualmente idêntica à Estação Ecológica, foi reintroduzida no texto final);
art. 14 (a RPPN foi elevada à condição de categoria de Unidade de Conservação do Sistema, em relação ao texto original; as categorias Reserva Produtora de Água e Reserva Ecológica Integradas foram suprimidas no texto final; a Reserva Ecológico-Cultural foi renomeada como Reserva de Desenvolvimento Sustentável;);
art. 17 (a presença de população tradicional, admitida no substitutivo, passa a depender de autorização do órgão competente no texto final);
art. 24 (introduziu a consulta pública prévia como condição para a criação de Unidades de Conservação; no texto final, esta consulta deixa de ser obrigatória no caso da criação de Estação Ecológica e Reserva Biológica; a já referida emenda apresentada no Plenário da Câmara conferiu ao Congresso a competência exclusiva para aprovar a criação de uma Unidade de Conservação);
art. 25 (introduzia a figura da interdição administrativa provisória; foi suprimido no texto final); art. 26 (as Florestas Nacionais foram excluídas do texto; o termo “contrato de concessão de direito real de uso” foi transformado em “contrato” apenas);
arts. 32, 35 e 38 (introduzidos pelo substitutivo);
art. 40 (as agressões às Unidades de Conservação foram criminalizadas);
art. 44 (o Poder Público, que antes se obrigava a relocar as populações residentes nas Unidades de Conservação agora obriga-se apenas a apoiar a relocação; o contrato de que trata o § 3º foi substituído, no texto final, por autorização do órgão competente);
art. 47 (foi suprimido);
art. 48, 49, 50 e 51 (introduzidos pelo substitutivo)
art. 58 (foi suprimido).
Fonte: Artigo ‘Breve histórico da origem e tramitação do Projeto de Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC’, de autoria de Maurício Mercadante.
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